sábado, 17 de maio de 2008

descobertas ou sobre quando o mundo acontece lá fora.


sou-me única medida de mim mesmo.
e, enquanto caminho, pressinto no gosto – no
tato
a verdade de um corpo
e a verdade de um verbo
conciliadas no grito
e volto a me visitar de pés descalços
chafurdando o barro do caminho
já tornado barro do corpo desfeito.

não há mais pressa, os anos
não me dizem o que sou. é sempre no agora o
meu combate.

só se visita o espelho de pés descalços. do contrário
o chão, infecundo, seduz menos que a miragem.

farei disso uma confissão.
não há lembrança que não seja torta, não
há voz que não se queira ouvida.
há um corpo, quase me
esqueço. um corpo que se quer tênue.
sempre que falo, falo do que sou
não porque seja, mas sim por que fale.

todo passo, todo passo é irretraçável. porque,
como tudo mais, ele habita o instante.

percebia pela primeira vez que não poderia
dizer tudo. e às vezes achava que se abrisse a boca
bem aberta, se falasse bem alto, qualquer palavra
que eu dissesse valeria por todas.
do tempo. nada me diz. nada me comunica mais.
nada me comunica mais da singeleza do tempo.

da espera, da espera. / da ânsia/ da força, do retorno/
do instante, de tudo o que é instantâneo.
do erro/ da voz, do grito/ da
palavra.//
rude ou cansada, do cansaço/
do caminho e da colheita. da cidade. das coisas do
corpo/ do corpo.
do corpo.
cada rua que passa deixa um rastro em meu
sorriso
— adiante.
mais um som, mais uma luz,
que venha outra voz
talvez outro corpo
— adiante.

trechos de: corpo tênue - maurício chamarelli gutierrez
foto: misha gordin

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